Certa ocasião, andava um homem a trabalhar no campo quando, perto do muro onde estava a cavar, deparou com duas cobras que saíam de um buraco. Ergueu a enxada para as matar, mas uma delas, levantou a cabeça, perguntando-lhe:
– Homem porque queres tu matar-nos?
– Tenho ouvido dizer que carne de cobra é boa para fazer chá e outras mezinhas – respondeu o lavrador.
– Pois deixa estar, acrescentou a outra que se tinha afastado um pouco vai-te embora, homem, e volta daqui a uma semana que eu te darei muita riqueza. Eu era como tu, mas fui enfeitiçada.
O lavrador, aceitando o trato, na mira de adquirir a fortuna que lhe permitisse comprar as vinhas e olivais com que sempre sonhara, foi-se embora deixando as cobras em paz.
Todas as semanas o lavrador passava pelo local, mas das cobras, nem sinal. Por ali se sentava durante largos momentos, na esperança de que o encantamento desaparecesse e, em vez das cobras, surgisse o casal enfeitiçado. Por histórias que tinha ouvido contar na meninice, sabia que para quebrar feitiços ou bruxarias, se deveria picar o animal e fazer-lhe sangue.
Um dia, desesperado com a demora e furioso por não conseguir a fortuna que lhe permitiria mudar de vida, afiou a faca e colocou-a à entrada do buraco por onde as cobras tinham surgido. Pouco tempo depois, apareceu uma delas. Deslizando devagar, muito atenta ao terreno, reparou na faca e desviou-se. Olhando à volta, viu o camponês. Desconfiando das suas intenções, disse-lhe muito zangada:
– Imbecil, não soubeste ter paciência e esperar pelos acontecimentos. Quiseste enriquecer à custa da minha vida. Pois tal tesouro nunca o chegarás a ver. Vou rogar-te uma praga, porque não tiveste confiança em mim e esperar pelo tesouro que te prometi. Perderás as pessoas que mais amas neste mundo.
O homem fugiu assustado e, quando chegou a casa, viu a mulher muito aflita, dizendo-lhe que a filha estava muito doente. Dirigindo-se para o quarto da menina, pegou-lhe na mão e, nesse instante, ela faleceu.
Poucos dias depois, ao regressar do trabalho, encontrou a esposa deitada na cama. A cara vermelha e os olhos brilhantes eram sinal da grande febre que a acometia. Pegou-lhe na mão para lhe perguntar o que haveria de fazer, mas ela virou a cabeça para o lado e expirou. Só então se apercebeu do grave erro que a impaciência e ganância o tinham conduzido, levando-o a perder aqueles a quem mais amava.