O dia 6 de Julho de 1664 chegara ao fim. A enorme bola de fogo, que se ia escondendo no horizonte, não deixava bons presságios à guarnição portuguesa que, no topo das altas muralhas de Castelo Rodrigo, vigiavam atentamente o acampamento espanhol que cercava a fortaleza.
Receando um ataque inimigo, os frades do Convento de Santa Maria de Aguiar mantinham a porta fechada, tendo-a trancado com cuidado. De repente, o porteiro sentiu leves pancadas. Intrigado, apurou o ouvido, e de novo se ouviram os suaves golpes. Avisando o Abade, este ordenou:
– Abri a porta. Quem bate tão mansinho, não pode ser nosso inimigo.
O frade porteiro obedeceu e, ao cumprir a ordem do Superior, deparou com uma velhinha que lhe disse, com muita ternura:
– Foi um familiar desta casa, que se encontra abrigado na capela de Santo Cristo, em Barca d’Alva, que me mandou avisar-vos de que os espanhóis tencionam atacar o Mosteiro durante esta madrugada. Fujam e levem o que puderem.
O monge, apavorado, perguntou-lhe:
– Fugir para onde, minha senhora? Os espanhóis estão por todo o lado!
– Não te aflijas – sossegou-o a velhinha. Eu sou a Senhora da Guia. Fugi com cuidado, pela ribeira abaixo, até encontrardes uma capelinha onde vos escondereis. Nenhum mal vos há-de acontecer. A ribeira vos há-de guiar.
Ainda o frade não tivera tempo de compreender o significado da visão e a Senhora desaparecia envolta numa nuvem. Não perdendo tempo, o monge avisou os outros irmãos, que carregaram algumas mulas com roupa, comida e o Relicário, onde guardavam a Hóstia Consagrada. Puseram-se então a caminho.
Se por um lado, a noite clara lhes facilitava a fuga, por outro, tornava-a perigosa, pois facilmente o inimigo os poderia descobrir e pôr-lhes termo. Mal sabiam que a bênção da Senhora da Guia os acompanhava. Assim, depois de longa caminhada, quando o céu começava a clarear, anunciando um novo dia, chegaram a salvo à capelinha de Nossa Senhora do Campo, na margem direita da ribeira de Aguiar, em Almendra.
Nessa noite, quando os espanhóis se dirigiam para o Convento, encontraram-no vazio. Ao outro dia, a 7 de Julho, o general Pedro Jacques de Magalhães apareceu em socorro da praça sitiada, derrotando o inimigo no lugar da Salgadela.
Os monges regressaram ao Mosteiro, passando a chamar-lhe “Convento de Nossa Senhora da Guia” e à ribeira deram o nome de “Ribeira de Aguiar“, baseando-se nas palavras da Senhora:
“Não abandoneis a ribeira que ela vos há-de guiar“!