Morou, há muito tempo atrás, na Penha d’Águia, um homem que tinha por nome Marcos. Este homem ganhava a vida roubando outros que passavam com bens e géneros na Serra da Vieira.

Montando um sistema que consistia num cordel com um chocalho amarrado, Marcos detetava a aproximação das suas vítimas eu, ao tropeçarem no cordel, faziam soar o chocalho acusando assim a sua presença.

A mulher de Marcos vivia muito desgostosa devido ao modo como Marcos ganhava a vida. Como foragido que era, Marcos nunca vinha ao povo e era a sua mulher que lhe levava roupas e alimentos. Numa destas visitas, Marcos deitou a cabeça no colo da mulher para esta lhe catar os piolhos e ela, enquanto o aliviava dos parasitas, ia-lhe dizendo:

    – Marcos, vê bem a vida de pecado que levas! Ofendes ao Senhor e desgraças-te, condenando-te aos martírios do Inferno.

Ao ouvir estas sensatas palavras da mulher, Marcos olhou os céus, arrependendo-se de todo o mal que tinha feito, e morreu ali mesmo, no colo da mulher. Lavada em lágrimas, a mulher cobriu o corpo de Marcos com folhas de carvalho, árvore abundante na Serra da Vieira, e voltou para casa, na Penha d’Águia.

Porém, a partir do momento em que deixou o seu marido na serra, tapado com folhas de carvalho, nunca mais choveu. Seguiram-se sete anos de seca e a população desesperava, com a fome e a miséria. Desesperado com a falta de água, o povo fez promessas, procissões, e romarias, rogando a Deus e aos Santos que lhe valessem.

Foi então que da própria Serra da Vieira que veio a salvação, ouvindo-se cada vez mais e mais alto:

– Se quereis água na terra

Ide buscar o Marcos à Serra.

O povo percebeu então de que Marcos se tratava e foram a casa da viúva de Marcos, o ladrão, para que esta lhes dissesse onde estava o marido enterrado.

Fizeram uma romaria à Serra e deram com o lugar onde a esposa dizia que estava o marido. E lá estava ele, Marcos, como no dia em que o tinha deixado, intacto e ainda com as folhas de carvalho a cobrir o seu corpo sem vida. Assim que o descobriram, começaram a cair umas tímidas pingas de chuva, que se foi adensando à medida que o corpo era levado para a Penha.

Marcos foi enterrado na Igreja, debaixo de intensa chuva que matou a fome e sede de sete anos.

Passou então a fazer-se a romaria à Serra da Vieira, em honra a S. Marcos. E dizem os mais antigos que assim que chegavam ao alto da Serra começava sempre a chover…

Recolhido na Penha D’Águia, em 2004